quinta-feira, 21 de março de 2013



BALEIA DOS AÇORES
                                               
Baleia-azul ("Balaenoptera musculus") nas águas dos Açores, ao fundo a ilha do Pico com destaque para a Montanha do Pico

A primeira referência documental à captura de baleias nas águas dos Açores remonta ao século XVI, ao largo da ilha de Santa Maria. De acordo com Frutuoso:
"No ano de mil e quinhentos e setenta e quatro acharam os pescadores uma baleia morta onde se chama o Mar de Ambrósio, e, por ser longe e estar um só batel, a não levaram a terra, inteira, senão muitas postas dela, de que fizeram muito azeite.
No ano seguinte de 1575, a derradeira oitava de Páscoa, apareceu outra, junto da Vila, e três ou quatro batéis, que foram a ela, a levaram à costa, junto de Nossa Senhora da Conceição, da qual se fez muito proveito e tiraram ambre (sic), que lá foi buscar desta ilha o feitor de el-Rei, Jorge Dias. Dizem que aproveitou, mas os pobres nada dele gozaram.
No mesmo ano, em meio de Junho, apareceu outra da banda de Sant'Ana, a qual tiraram em terra no porto de Nossa Senhora dos Anjos, de que se fizeram dez ou doze pipas de azeite.
Daí a poucos dias, acharam outra da mesma banda de Sant'Ana, mas porque já andavam os homens enfadados, e ser tempo de aceifa, não curaram dela, até que desapareceu de todo.
Os anos passados, foi achado em Sant'Ana um grande pedaço, que parecia tábua de uma coisa como cevo e da mesma sua cor, que ardia mui bem, e diziam que também aproveitava para frialdade, sem se acabar de determinar o que seria.[2] E muitos há que em São Lourenço saiu um baleato pequeno, afora outros que não lembram."[3]
Embora se registe a presença de baleeiros ingleses no século XVIII, a caça sistemática ("baleação") nas águas do arquipélago só se iniciou na segunda metade do século XVIII e do século XIX, com a chegada dos navios baleeiros dos Estados Unidos, nomeadamente aqueles oriundos de New Bedford[4] e de Nantucket. Ao arregimentavam homens para completar as suas tripulações nas ilhas, foi com eles que os açorianos aprenderam as técnicas e o domínio dos instrumentos, patente no uso do próprio vocabulário baleeiro, quase que totalmente de origem anglo-saxónica.[5]
É com a experiência desses homens que, na década de 1850 se constituíram as primeiras armações baleeiras nos Açores, nas ilhas do Oeste. Para isto foram fundamentais as embarcações baleeiras (adaptações dos primeiros modelos importados de New Bedford pela família Dabney, do Faial), de palamenta apropriada e com tripulação de, pelo menos, 7 homens (mestre, arpoador/trancador, remador e marinheiros). O Topo, na ilha de São Jorge, foi a primeira localidade onde se armaram canoas. Nas Velas, foi arpoada a primeira baleia em janeiro de 1886.
Na década de 1880, constituíram-se armações no Grupo Oriental, a partir da ilha de São Miguel.[6] Nesta ilha existiram quatro companhias baleeiras:[7]
  • No Calhau Miúdo das Capelas, junto ao Morro, fundada a 29 de outubro de 1884;
  • No porto de Santa Iria, na freguesia da Ribeirinha, fundada no mesmo ano (1884);
  • Na Grota, junto à Praia Grande dos Mosteiros, a "Companhia Pescadora", fundada em 23 de Outubro de 1885 da qual era gerente o conhecido industrial João de Melo Abreu;
  • No Castelo do Porto Formoso, a "Companhia Baleeira Esperança", fundada por alvará de 20 de abril de 1886.
Além destas, o Governo Civil de Ponta Delgada passou ainda, com data de 5 de Agosto de 1885, alvará provisório a Amâncio Júlio Cabral e José Maria Pimentel, para criação de uma empresa dedicada à pesca de cetáceos no Areal Grande de S. Roque, na costa sul da ilha.
Todas estas empresas tiveram existência mais ou menos efémera, à exceção da Companhia Baleeira das Capelas/São Vicente que, ao longo dos anos cresceu em meios e equipamentos, tendo aumentado as suas capacidades operacional e técnica, a ponto de ter se constituído uma das empresas de maior dimensão e com mais longa existência no arquipélago (1884-1983).[8]
As campanhas baleeiras no arquipélago tinham lugar anualmente, de 15 de maio a 15 de setembro. Eram utilizados os chamados "botes de boca aberta", típicos dos Açores, e arpões. Após a captura, as carcaças dos cetáceos eram objeto de desmanche para a extração do óleo ("azeite"), do âmbar-gris, das barbatanas e da carne. Os ossos eram reduzidos a farinha. Até à década de 1930, a extração do chamado "azeite de baleia" ainda era processada pelos próprios baleeiros, por um processo artesanal conhecido como "a fogo direto", em instalações denominadas "traiois", constituídas por duas caldeiras adossadas, assentes sobre uma fornalha. Na ilha de São Jorge, em 1936, registavam-se quatro armações: três nas Velas e uma no Topo.
Em meados do século XX, esse trabalho foi pouco a pouco sendo substituído pela industrialização do processo, em fábricas de derretimento, que utilizavam autoclaves a vapor de grande capacidade.
Desde 1987 que deixou-se de praticar a "caça" à baleia em Portugal, tendo o último cachalote sido caçado naquele ano, ao largo da vila das Lajes do Pico.[9] O comércio dos produtos extraídos da baleia (inclusive o marfim, não assinalado) foi proibido.

[editar] Madeira

A história da atividade baleeira no Arquipélago da Madeira ocorre praticamente no século XX apesar de nos séculos anteriores se caçar nas águas do arquipélago, recorrendo a mão de obra madeirense.
Em 1940 instala-se a primeira armação baleeira na Madeira com a chegada dos primeiros baleeiros e das primeiras baleeiras vindas dos Açores e com a construção de um “traiol” (Designação dada a estações de processamento rudimentares, que permitiam a extração do óleo pelo meio de panelas de grande dimensão, assentes sobre fogo direto. Estas estações eram frequentemente desprovidas de rampas para varagem dos animais) localizado a Este da foz da Ribeira da Janela, no concelho do Porto Moniz.
Só no início de 1941 é que se deram os primeiros abates que ocorreram na zona Norte, esses animais forram transformados em óleo no referido “traiol”.
Em 1942 foi construída mais um “traiol”, desta vez no Caniço, mais concretamente no calhau do Garajau, esta construção visava aumentar a capacidade produtiva da armação baleeira e em poucos anos levou ao abandono do primeiro.
No fim da década de 1940 foi iniciada a construção da fábrica do Caniçal, que substituiu o “traiol” do Garajau. Esta construção veio aumentar a capacidade produtiva da Empresa Baleeira da Madeira, por se tratar de uma unidade fabril muito mais moderna e melhor equipada.
O sucesso desta atividade baseou-se na construção de uma rede de vigias que, posicionadas em zonas costeiras altas, permitiam uma cobertura integral da costa da Ilha da Madeira, bem como uma cobertura parcial dos mares das Desertas e Porto Santo. Desta forma a Ilha da Madeira possuía 8 vigias, sendo uma delas no Pico da Cruz (no complexo militar do RG3, em S. Martinho), e outra na Ponta do Garajau (abaixo da estátua do Cristo Rei do Garajau). Esta rede completava-se com duas vigias na Deserta Grande, uma na Ilha do Bugio e duas na ilha do Porto Santo. Estes edifícios davam abrigo aos homens que sondavam o mar em busca dos “espartos” (termo importado dos Açores, para designar o sopro característico dos grandes cetáceos).
A caça atingiu o seu auge neste arquipélago na década de 1950 e 1960, com o pleno funcionamento das já referidas instalações fabris.
Nos anos setenta, com o crescimento do movimento internacional para a defesa das baleias, houve uma interdição de comercialização dos produtos extraídos destes animais por alguns países, que até então eram os principais compradores da produção madeirense, nomeadamente os Estados Unidos, a Inglaterra e a França. Essa interdição conduziu ao fim voluntário da baleação no arquipélago, que cessou em 1981.
A partir de 1986, o Decreto legislativo regional Nº 6/86/M tornou as águas em redor do Arquipélago da Madeira, até às 200 milhas, numa espécie de santuário para baleias, golfinhos e outros mamíferos marinhos, nomeadamente para a rara Foca-monge-do-mediterrâneo também conhecido como lobo-marinho.
O Museu da Baleia da Madeira conta agora com recentes e modernas instalações onde narra toda a história da caça à baleia decorrida no Arquipélago da Madeira. Os aspetos da biologia e da proteção das baleias e golfinhos são abordados na exposição contribuindo para a sensibilização de todos para a necessidade de preservar estes animais.

 

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